Um dia triste para o país.
Foi hoje aprovada no parlamento, com votos favoráveis de PSD, PCP, PEV e PAN, uma lei que permite a um grupo de engenheiros (ninguém sabe quantos) assinar projectos de arquitectura, revertendo a lei anterior que reservava aos arquitectos o exercício da arquitectura.
Reduzir esta questão apenas ao interesse corporativo da classe dos arquitectos é profundamente errado. O que está essencialmente em causa não é os referidos engenheiros poderem competir ou tirar trabalho aos arquitectos. Isto também acontecerá, mas será residual e fora dos centros urbanos.
Falo por mim, mas não me interessa competir com este tipo de oferta, obviamente muito pouco qualificada.
Quando um cliente prescindir dos meus serviços porque se revê no que um destes profissionais possa oferecer, principalmente nos preços que praticará, pois que faça bom proveito. Acresce que os potenciais clientes estão hoje em dia muito mais esclarecidos em relação à real mais valia de contratar um arquitecto, quanto mais não seja pela valorização que um bom projecto irá induzir ao que pretende realizar, do grande edifício ou urbanização à pequena remodelação de interiores. Recuso-me por isso a entrar nesse campeonato, como o fará a esmagadora maioria dos arquitectos. Quando o único factor para me escolherem for o preço, talvez seja melhor dedicar-me a actividades mais rentáveis e menos trabalhosas. A excepção será talvez os recém licenciados e jovens arquitectos que, se já tinham de competir com os colegas mais experientes e com carteiras de clientes mais solidificadas, terão ainda mais dificuldade em encontrar o seu espaço, em especial no "país profundo".
O que é inacreditável é o mau serviço causado à coisa pública, com as consequências que irão advir para uma paisagem tão martirizada por anos de más práticas, situação que os últimos anos tinham conseguido, apesar de tudo, atenuar.
Reduzir o exercício da arquitectura a conseguir desenhar uma casa que não caia e onde não entre água é, mais do que um atestado de mediocridade a todo país, um retrocesso civilizacional.
Nos últimos anos, e apesar da crise (talvez também induzida por esta) a qualidade da arquitectura portuguesa tem sido consistentemente elevadíssima, como os numerosos prémios em concursos e distinções individuais de membros da classe atestam.
Houve grandes arquitectos que não tiveram uma educação formal, como F.L. Wright, Corbusier, Ando ou Scarpa, e que ainda assim produziram obras notáveis, entre as melhores de que há registo. Mas foram casos excepcionais, em contextos culturais e económicos diferentes, alicerçados numa enorme sensibilidade, cultura e investigação individuais e apoiados numa prática profunda do metier, frequentando sólidos ateliers e aprendendo a profissão sempre numa perspectiva de auto-crítica, rigor e exigência. Pergunto, quantos Scarpas se conhece na Beira Baixa? Quem me consegue apresentar uma obra decente desenhada por um dos referidos profissionais? Já não digo premiada ou excelente, apenas um bom projecto? Confesso que me lembro sempre dos notáveis projectos do Eng.º Pinto de Sousa...
Uma última palavra para o que se passou hoje na assembleia de república: apenas algo definitivamente podre pode ter unido PSD, PCP e PAN. Vergonhosa unanimidade na reposição deste disparate legislativo, manchada por clientelismos, guerrinhas de influências das ordens profissionais e caciquismos locais.
Quem perde acima de tudo não são os arquitectos, é o país.
Salvam-se nesta triste história o PS, o CDS e o BE.
Definitivamente, já sei em quem vou votar nas próximas eleições...
Foi hoje aprovada no parlamento, com votos favoráveis de PSD, PCP, PEV e PAN, uma lei que permite a um grupo de engenheiros (ninguém sabe quantos) assinar projectos de arquitectura, revertendo a lei anterior que reservava aos arquitectos o exercício da arquitectura.
Reduzir esta questão apenas ao interesse corporativo da classe dos arquitectos é profundamente errado. O que está essencialmente em causa não é os referidos engenheiros poderem competir ou tirar trabalho aos arquitectos. Isto também acontecerá, mas será residual e fora dos centros urbanos.
Falo por mim, mas não me interessa competir com este tipo de oferta, obviamente muito pouco qualificada.
Quando um cliente prescindir dos meus serviços porque se revê no que um destes profissionais possa oferecer, principalmente nos preços que praticará, pois que faça bom proveito. Acresce que os potenciais clientes estão hoje em dia muito mais esclarecidos em relação à real mais valia de contratar um arquitecto, quanto mais não seja pela valorização que um bom projecto irá induzir ao que pretende realizar, do grande edifício ou urbanização à pequena remodelação de interiores. Recuso-me por isso a entrar nesse campeonato, como o fará a esmagadora maioria dos arquitectos. Quando o único factor para me escolherem for o preço, talvez seja melhor dedicar-me a actividades mais rentáveis e menos trabalhosas. A excepção será talvez os recém licenciados e jovens arquitectos que, se já tinham de competir com os colegas mais experientes e com carteiras de clientes mais solidificadas, terão ainda mais dificuldade em encontrar o seu espaço, em especial no "país profundo".
O que é inacreditável é o mau serviço causado à coisa pública, com as consequências que irão advir para uma paisagem tão martirizada por anos de más práticas, situação que os últimos anos tinham conseguido, apesar de tudo, atenuar.
Reduzir o exercício da arquitectura a conseguir desenhar uma casa que não caia e onde não entre água é, mais do que um atestado de mediocridade a todo país, um retrocesso civilizacional.
Nos últimos anos, e apesar da crise (talvez também induzida por esta) a qualidade da arquitectura portuguesa tem sido consistentemente elevadíssima, como os numerosos prémios em concursos e distinções individuais de membros da classe atestam.
Houve grandes arquitectos que não tiveram uma educação formal, como F.L. Wright, Corbusier, Ando ou Scarpa, e que ainda assim produziram obras notáveis, entre as melhores de que há registo. Mas foram casos excepcionais, em contextos culturais e económicos diferentes, alicerçados numa enorme sensibilidade, cultura e investigação individuais e apoiados numa prática profunda do metier, frequentando sólidos ateliers e aprendendo a profissão sempre numa perspectiva de auto-crítica, rigor e exigência. Pergunto, quantos Scarpas se conhece na Beira Baixa? Quem me consegue apresentar uma obra decente desenhada por um dos referidos profissionais? Já não digo premiada ou excelente, apenas um bom projecto? Confesso que me lembro sempre dos notáveis projectos do Eng.º Pinto de Sousa...
Uma última palavra para o que se passou hoje na assembleia de república: apenas algo definitivamente podre pode ter unido PSD, PCP e PAN. Vergonhosa unanimidade na reposição deste disparate legislativo, manchada por clientelismos, guerrinhas de influências das ordens profissionais e caciquismos locais.
Quem perde acima de tudo não são os arquitectos, é o país.
Salvam-se nesta triste história o PS, o CDS e o BE.
Definitivamente, já sei em quem vou votar nas próximas eleições...